sábado, janeiro 31, 2009

Pergunto-me e pergunto-vos (se por acaso, se sentirem inspirados a, com tempo de, com pachorra para) se na meia idade, algum momento será capaz de, metafóricamente, ser o cais de chegada ao nosso primeiro cais de partida...?



Isto é, divagando através das aprendizagens obrigatórias e colhidas durante os trinta anos que separam ambos os cais, vagabundeando através das inúmeras estradas experimentadas ao longo dessa viagem temporal, pergunto-me se ao chegarmos a determinado ponto da linha traçada da nossa vida, poderemos considerar o traçado, rampa de lançamento para a restante linha ainda difusa que, a nossos olhos, é o futuro...?





Quero acreditar que sim, que ainda somos capazes desse grandioso empreendimento que é a vida, com todas as vantagens e desvantagens que as experiências de vida nos trouxeram, de conseguirmos, a partir de certo momento, fazer as escolhas mais acertadas para nós, termos a visão que nos permite actuar com serenidade e a sabedoria que nos incitará a dar -ou não- um passo em relação a essa nova e magnifica viagem, a que chamamos recomeçar...





Sentada numa estação de comboios, entre partidas e chegadas de rostos que nada me dizem, quase me atrevo a acreditar que, a magia de toda a viagem estará encerrada nesse mesmo desafio de nós próprios, conseguirmos chegar a descobrir e a compreender, sem véus ou falsas ilusões, essa mesma e única essência, que um dia nos levou a partir e nos trouxe de volta a nós...
naquele exacto momento...









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Música: Walk of Life, Dire Straits

sexta-feira, janeiro 30, 2009

Voar


nas cordas de um violino


nas asas

ilimitadas

de

uma

melodia





e...





pousar. Muito tempo depois.

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Bom fim de semana!

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Música: Parca 1, Farid Farjat

terça-feira, janeiro 27, 2009

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Espírito relativamente jovem, irrequieto e ávido procura novo corpo para habitar.
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Tem dias.

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O espírito companheiro e vigilante acompanha o rebuliço das ruas do mundo, mas o corpo, esse, confesso, tem dias que só anseia pelo calor e por tardes soalheiras, a estenderem as pernas em toalhas, à beira mar...



Música: 1ª Mummers' Dance, Loreena McKennitt

2ª Creep, Album Jazz and '90s, Karen Souza

domingo, janeiro 25, 2009

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Rasgo
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porque é urgente quebrar o feitiço da melancolia que nos detém, desta mórbida nostalgia que nos arrasta a alma, sem sequer almejar a ser diferente. Rasgar o hábito, o sofá, a areia onde todas as noites escondemos a cabeça, para não pensar, para não sentir, para não perceber, para não sofrer.
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todos os cinzentos.
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todos os dias pardos de que enchemos os olhos ao acordar, este vazio pardo, esta rotina pardacenta, de gestos autómatos, sorrisos pardos e afectos pardos, desgastados da paixão que um dia sentimos.
Parda esta esperança finita de chegar ao fim do dia, ainda acordados.
Pardacento este desgosto de não sermos outros, não termos outras vidas, outros horizontes,
outros desejos que não este: não saber -não querer saber- a intensidade deste cinzento, sufocante.
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para lá do papel do desejo e do esboço.
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para lá do papel que representamos, existe contudo ainda um céu oblíquo para nos encontrarmos, para nos parirmos outros, mais fortes e sábios, mais emotivos e puros do que este esboço, que fizeram de nós e nós, por distracção, permitimos.
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da parede de dentro para o ímpeto do gesto.
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e quando com coragem nos enfrentamos, do coração recebemos ainda assim sinais vitais, num ímpeto de realização final.
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Rasgo o tempo. o vento. o aço.
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Rasgo assim em mim este tempo de não reconhecimento de mim e sei que por muito que doa, eu sou aquele que o espelho me oferece e por muito que doa eu sou aquele que o vento fustiga e por muito que doa eu hoje decido que não permito o aço, em mim.
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ilumino-me.

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Música: Slap that Bass (Miguel Migs Petalpusher Remix), Ella Fitzgerald & Miguel Migs

sábado, janeiro 24, 2009

Um sociopata tem aversão a sociedade, um psicopata não tem essa aversão, mas é um indivíduo que transgride as regras e as normas sociais.

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Neste tempo conturbado de noticias várias -vindas de vários pontos do planeta- em que tanto se fala de violência doméstica, de crianças submetidas a sofrimentos vários, de crimes, capangas, corrupção, de desistência, de psicologia, de perfis psicológicos, de transtornos de personalidade, do poder dos sociopatas, do poder dos psicopatas e do poder que no dia a dia, inadvertidamente, pessoas incautas, de boa fé e vontade (ou não) e algumas delas, de certa forma, por isso mesmo, desprotegidas -e a falta de protecção pode ser de várias índoles- lhes vão dando, é bom relembrar esses mesmos perfis, na tentativa de não os deixar chegar ao poder que eles tanto ambicionam.





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Sociopata: "As características dos sociopatas englobam, principalmente, o desprezo pelas obrigações sociais e a falta de consideração com os sentimentos dos outros. Eles possuem um egocentrismo exageradamente patológico, emoções superficiais, teatrais e falsas, pobre ou nenhum controle da impulsividade, baixa tolerância para frustração, baixo limiar para descarga de agressão, irresponsabilidade, falta de empatia com outros seres humanos, ausência de sentimentos de remorso e de culpa em relação ao seu comportamento. Essas pessoas geralmente são cínicas, incapazes de manter uma relação leal e duradoura, manipuladoras, e incapazes de amar. Eles mentem exageradamente sem constrangimento ou vergonha, subestimam a insensatez das mentiras, roubam, abusam, trapaceiam, manipulam dolosamente seus familiares e parentes, colocam em risco a vida de outras pessoas e, decididamente, nunca são capazes de se corrigirem. Esse conjunto de caracteres faz com que os sociopatas sejam incapazes de aprender com a punição ou incapazes de modificar suas atitudes. Quando os sociopatas descobrem que seu teatro já está descoberto, eles são capazes de darem a falsa impressão de arrependimento, falseiam que mudarão "daqui para a frente", mas nunca serão capazes de suprimir sua índole maldosa. Não obstante eles são artistas na capacidade de disfarçar de forma inteligente suas características de personalidade. Na vida social, o sociopata costuma ter um charme convincente e simpático para as outras pessoas e, não raramente, ele tem uma inteligência normal ou acima da média."





Psicopata: "O psicopata, por sua vez, superdimensiona suas prerrogativas, possibilidades e imunidades; "esta vez não vão me pegar", ou "desta vez não vão perceber meu plano", essas são suas crenças ostentadas.Toda lei ou norma, gera temor e inibição, implicam na possibilidade de castigo. A lei está feita para domar, para obrigar e para condicionar as condutas instintivas dos indivíduos. O psicopata não apenas transgride as normas mas as ignora, considera-as obstáculo que devem ser superados na conquista de suas ambições. A norma não desperta no psicopata a mesma inibição que produz na maioria das pessoas.Para os contraventores não psicopatas, vale o lema "Se quer pertencer a este grupo, estas são as regras. Se cumprir as regras está dentro, se não cumprir está fora". Mas o psicopata tem a particularidade de estar dentro do grupo, apesar de romper todas as regras, normas e leis, apesar de não fazer um insight, não se dar conta, não se arrepender e não se corrigir. Sua arte está na dissimulação, embuste, teatralidade e ilusionismo.Os psicopatas parecem ser refratários aos estímulos, tanto aos estímulos negativos, tais como castigos, penas, contra-argumentações à ação, apelo moral, etc., como também aos estímulos positivos, como é o caso dos carinhos, recompensas, suavização das penas, apelos afetivos. Essa última característica é pouco notada pelos autores. O psicopata não modifica sua conduta nem por estímulos, positivos, nem pelos negativos.Para o psicopata a mentira é uma ferramenta de trabalho. Ele desvirtua a verdade com objetivo de conseguir algo para si, para evitar um castigo, para conseguir uma recompensa, para enganar o outro. O psicopata pode violar todo tipo de normas, mas não todas as normas. Violando simultaneamente todas as normas seria rapidamente descoberto e eliminado do grupo.A particular relação do psicopata com outros seres humanos se dá sempre dentro das alterações da ética. Para o psicopata o outro é “uma coisa”, mais uma ferramenta de trabalho, um objeto de manipulação. Essa é a coisificação do outro, atitude que permite utilizar o outro como objeto de intercâmbio e utilidade. Esta coisificação explica, talvez, torturar ou matar o outro quando se trata de um delito sexual, sádico ou de simples atrocidade."
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"Mentes Perigosas", escrito por Ana Beatriz Barbosa Silva, Médica Psiquiatra, parece-me ser um livro a ler e a não esquecer:

http://www.objetiva.com.br/objetiva/cs/?q=node/1690

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Tenho a noção que é uma humilde contribuição da minha parte para esta sociedade que tantas páginas de jornal faz escrever. Tenho a noção, que neste sábado de sol envergonhado, um poema suave ou sensual talvez vos caísse melhor. Ou escrever sobre a esperança.
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Desculpem.
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Mas é exactamente sobre a esperança que escrevo.


É a esperança que me leva a escrever, a procurar, a encontrar respostas.

Se não soubermos identificar como saberemos enumerar, argumentar, duvidar, defender os nossos direitos e ideais?


Na esperança de um mundo mais lúcido e mais forte no combate à desistência, ao desespero e ao poder do mal.


Deixo-vos um esboço de flores. Para me redimir :)

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Música: 1ª Adágio G minor, Albinoni (The London Fox Orchestra)

..............2ª Sinnerman, Nina Simone versão Felix Da Housecat's....(nota minha: batimento para acordar rssss)

quinta-feira, janeiro 22, 2009


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“Antes, os psicopatas tocavam num mistério que não queríamos conhecer.


Tínhamos medo deles.


Hoje, temos de competir com os psicopatas, que em geral nos vencem, com sua eficiência,


rapidez e falta de escrúpulos.


Estamos vendo que essa antiga doença vai acabar virando uma ‘virtude’ no futuro.”

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Arnaldo Jabor, critico, cineasta e jornalista

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Música: The Boulevard of Broken Dreams, Diana Krall

quarta-feira, janeiro 21, 2009

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se a mudança acontecer
os países deixarão de ser ilhas
muradas
de línguas estranhas.

e os oceanos serão distâncias irrelevantes.

Talvez então faça sentido
no início de cada carta
escrever as coordenadas,
na origem de cada
palavra nossa.

talvez então, a gravata
na metamorfose
do tempo
seja
bússola.

E os homens navios
sem naufrágio à vista.

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Música: Inquietação, Voz de JP Simões (letra e música de José Mário Branco)

terça-feira, janeiro 20, 2009

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Há dias em que o mundo é um sitio bonito.
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Música:When the Saints Go Marching In, Louis Armstrong.
"...A mulher sai da casa pelo caminho das palavras e olha a árvore. O que está fora de si é mútuo do que está dentro de si. É esse o seu canto, a sua transparência, a sua premonição.
Aquela de quem não se diz "ela", mas "tu", volta a olhar a árvore - e o olhar com que a olha é uma escuta. Tu sabes que o mundo chega-nos através de um lapso na destruição, por intermédio de um nó no desfazer. Imaginas a realidade porque ela te pede que lhe restituas o que lhe tiraram. Distrais-te do tempo porque ele é como os cabelos que crescem e que caem. Deixas a carga porque o que pesa não tem fulgor nem medo. Tu caminhas no teu caminho, e as palavras são pedras quentes, aves subterrâneas, rios imersos, ramos curvados, rostos errantes, astros desiguais.
A mulher entra em casa pelo caminho dos animais, aquele onde eles são o inverso de um sonho mais distante. Andas com passo leve, assim são leves as folhas que o vento agita e não possui. A mulher deixa a sua pegada como se o chão fosse um mar de sombras áridas e árduas. Avanças sobre a terra, e ela é a tua morada, o teu leito, a raiz da tua felicidade, a corda que te prende ao movimento, a distância ao poder e ao desterro.
A mulher entra em casa, e o coração não se distingue dela. Entras em ti, e a luz faz-te passar pelo seu verso, deixa-te andar colada ao seu recuo. Passas e deixas para trás o que levas, porque essa é a boa lei para se viver sem nada, para se morrer com tudo.
A mulher está sentada na sua margem, na sua absorção, no seu entardecer. As suas mãos são múltiplas como tudo o que existe: heterónimas uma da outra, até ao infinito..."


José Manuel dos Santos

segunda-feira, janeiro 19, 2009

com a ternura da Márcia

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Para as mulheres que, de diferentes modos,
constroem um mundo diferente.
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Para todas vós
que convoco.

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Vénias minhas.
{sem vocês
o mundo
e eu
seríamos mais pobres}.


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Música: Where The Wild Roses Grow, Nick Cave & Kylie Minogue

domingo, janeiro 18, 2009

Latitude: 31º 30'N Longitude: 34º 28' E



A noite cai neste quarto minguante de lua desfeita em pó.

Doiem-me os ossos da alma. Juro-a doente. Como ter esta dor a percorrer-me as veias, sem uma qualquer doença fatal? Como voar se nos céus, o fumo das casas incendiadas me ferem as pupilas e dilatando o coração ao máximo que é permitido cardiológicamente, ainda assim, o sinto apertado, aprisionado, refém de fumos e fogos e olhos e ais?

Onde está o mel das tâmaras que me ofereceste?

Onde está o cântico dos regatos que prometias ser de paz e amor?

Onde está o meu irmão?

Tropeço.

Os arames farpados sobreviveram ao enterro do erro.

E o mundo é este erro contínuo de fumo e chacina.

Tenho a alma doente, fatalmente doente. Morro, sem alguma vez ter provado o mel das tâmaras que me ofereceste e sem algum dia, ter serenado nas tuas águas, meu corpo.






Latitude 38º 43'N Longitude 9º 08' W


O mundo é uma imensa mesa de jogo; dividimos-nos em dois grupos: mas os que jogam as seis mãos negativas são sempre em maior número dos que já passaram para a fase seguinte, das quatro rodadas positivas.


Poucos sobrevivem ao King.


Tenho frio, o mundo cansa-me, destroi-me a esperança, não gosto de processar de forma tão rápida, tanta informação, a tantas mãos, descoordenadas. Acendo um cigarro, bebo devagar, sem conseguir afastar este cálice. Amargo.


Eremito-me.

Música: Metáfora, Gilberto Gil.

.......... Rapaz a Arder, Naifa.

...........Até sempre, João, obrigada pela música e por todos os momentos em que nos levaste a cantar.



sábado, janeiro 17, 2009



No dia em que ficara sózinha, a mulher sentiu um ser estranho entre as sombras dos móveis, limpos de pó .
Era uma presença imperceptível, nunca ela, jamais o viu ou percebeu, onde se escondia.
Se dentro de alguma caixa, daquelas antigas, que ela guardava da avó, forradas a flanela quadriculada ou de flores miúdas, lembrando a chita dos aventais das varinas, se por ventura, dentro da sua imaginação.
Sentia, ainda assim, que a afagava na face, quando por fim adormecia, sem valiuns ou outros s.o.s., que não o cansaço e, muitas vezes, que a acordava de mansinho, farejando água nos seus olhos, ou résteas de sol, nos seus cabelos...


Sabia por ele, ou através da sua presença diáfona, quase espiritual, se tal ideia não for sacrilégio para os mais tementes, da necessidade de abrir a porta, da fome de ar ou de espaço.
Nomeado foi, logo ao terceiro dia, que a mulher sempre gostou de dar nomes às coisas e aos seres que aceitava em si, mas para aqui nenhum interesse tem, o nome que lhe deu ou que ainda lhe dá, nessas noites, em que a convidam para sair e ela, com um sorriso, se escusa.



E embora goste do ar frio da noite, das luzes vadias que dançam nas janelas dos prédios adormecidos, do sabor do whisky misturado com o do café, que lhe escalda os dedos nus de anéis, da música de um saxofone boémio, embore goste do cruzar de rostos e olhos que na noite acontecem, de aspirar os perfumes dos corpos estranhos que por ela passam, embora tudo isso, ainda exista dentro de si, ainda assim, fica.
Dele, nunca encontrou um pelo, dele nunca ouviu um som.

Sabe-o contudo, deitado na sua manta, olhos de jade no escuro da noite,desafiando a barreira de solidão, deste espaço tão seu, tão cópia sua, tão a si modelado...

Um dia -ou teria sido uma noite?- desabafou com alguém, que era como se vivesse com um gato.
Rápidamente lhe disseram: Cuidado! Quando uma mulher decide ter um gato é porque escolheu ser celibatária!
A mulher ficou contente, porque embora decididamente não tivesse escolhido fosse o que fosse, por fim, tinha conseguido explicar a presença de um gato -daquele gato, não de um gato qualquer - na sua vida.

Não se lembrava de lhe ter aberto a porta, nem de o ter desejado. Apenas se apercebera dele, no seu espaço.
Por isso, fica pouco à vontade, cada vez que não foi ou não vai, sem causa aparente, beber um copo à noite ou mostrar através dos seus olhos, o mar do Guincho. Como explicar aos outros a presença constante e atenta de um gato (avesso a mares, a olhares e whiskys duplos), sem a chamada de um qualquer serviço de urgências ao domicilio? E quando a levassem, quem ficaria para abrir a porta ao gato, aos primeiros sinais do dia?

Fica tão bem consigo e com ele, entre as páginas já escritas de uma vida ou de um livro ainda por ler..

Afagado gato, resistente ao tempo...









Música: Ai Mouraria, Rão Kyao

quarta-feira, janeiro 14, 2009

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...era uma casa tão espaçosa, mas tão espaçosa, que nela chegaram a cohabitar os sonhos megalómanos de dois seres...

...antagónicos.
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Música: Melody from a bamboo house, Liu Fang.

terça-feira, janeiro 13, 2009

Carta para o Zé, na impossibilidade de o visitar

Mesmo que corramos o risco de ficarmos sós, dizes-me tu e sais, deixando-me entregue ao tudo o resto que dizes e que eu partilho. Não, não me julgues simpática ou facilmente manipulável.
Há muito que me insurjo contra os números que tendenciosamente, ao longo da vida nos vão tentando colar na testa, por vezes, bordar no coração. Nunca me sujeitei a um número, por mais simpatia que tenha por alguns deles, como o nove, por exemplo e nunca me calei perante a avassaladora certeza que estavamos a ser meros peões de um jogo de interesses. É nessa parte da descoberta, que leva à denúncia, que normalmente ficamos sós. Eu sei.
Ficar só, foi muitas vezes o pronúncio da loucura de mais ninguém ver o que eu via.
De mais ninguém sentir o que eu sentia.
Aquela estranha sensação de só nós sabermos algo, que o tempo ainda não permitia que os outros soubessem, aquela estranha sensação de só nós sabermos algo, ainda vedado aos olhos dos outros, que normalmente acreditam no poder, na vaidade e na força das pessoas números, robots pardos de fato cinzento e gravata vermelha.
Eu sei o que é correr o risco.
Eu sei o que é acreditar em nós e nesta espécie de intuição que nos esmaga a simplicidade do ser, que nos remete para os infernos da solidão, das buscas entrincheiradas nas prateleiras da fnac (passe a publicidade...!) sobre papéis e angustias que o tempo não dissolve nunca, antes dilacera , das perguntas mais ou menos dificeis a que nos leva essa tal de intuição ou sensibilidade, para os fenómenos mais ou menos explicados de uma sociedade febril, que gosta de andar em bando, fazer parte de um bando. Nem que seja de pardais. Em busca de milho. Pois...
Sei também que em estado normal, o tempo se encarregará, de mostrar muitas vezes, que aquele que correu o risco e que acabou por ficar só, tinha razão.
Mas em estado puro, nós nunca queremos ter razão. Queríamos, antes, ter sido felizes.
Acabamos por o ser, de uma outra forma, inimaginável ou nunca arquitectada por malicia, antes vivida de uma forma consciente e natural de acordo com os nossos principios e ideais.
E assim viemos desaguar de novo à Omer, que luta e se debate pelos seus ideais, no seu direito à liberdade individual, de não querer ser militar, não querer matar, não querer ser um número, não querer iniciar-se nos pactos e nas cumplicidades de sangue e guerrilha, que a iriam tornar uma completa estranha a si mesma. Como ela tantos outros, de ambos os lados de todas as questões. Sempre foi assim e sempre assim será.
Sem a liberdade individual e sem o atrevimento de a por-mos em prática, meu caro Zé, não passaríamos de números ou de peões.
Mesmo com a promessa, de não morrermos sós.
Um abraço.
Ps- Escrever neste momento para Omer, talvez não seja o melhor para ela e para a sua esperança de vida. Temo-o, no meu consciente e constante receio de manipulação e analisando todas as frentes deste fogo. Dá-la a conhecer como exemplo de uma corajosa lutadora, pela sua liberdade individual, sempre.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

Recebi, vindo da Val Du, do Blog "Loucuras de Lady Lita"

este selo, que muita alegria me deu! Obrigada Val :) Valeu, também :)






"Com o Prêmio Dardos se reconhecem os valores que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, étnicos, literários, pessoais, etc. Que em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras. Esses selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os blogueiros, uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web."

E os indicados ao prémio, são:

http://agaioladedarwin.blogspot.com/

http://bettips.blogspot.com/

http://cafe-com-leitmotiv.blogspot.com/

http://espessahumanidade.blogspot.com/

http://espreitador.blogspot.com/

http://foiavenidasvelhas.blogspot.com/

http://lola123456.blogspot.com/

http://o-regresso-da-tia.blogspot.com/

http://sitiopoema.blogspot.com/

http://pas-s-ages.blogspot.com/

http://relogiodependulo.blogspot.com/

http://mrdoc2006.blogspot.com/

http://seilaeli.blogspot.com/

http://sidaccao.blogspot.com/

http://teiaemfionegro.blogspot.com/





Se está na minha lista, por favor:
Exiba a imagem do Prêmio.
Poste o link do blog pelo qual recebeu o Prêmio.
Escolha outros 15 blogs para você entregar o Prêmio.
Avise seus escolhidos.

-Facultativo, não obrigatório :)





Música: At first light, Silje Nergaard

domingo, janeiro 11, 2009




É domingo, está sol e vivemos na Europa.

Que mais se pode desejar?

Os filhos e netos brincam quentes, agora.

As mulheres prodigializam-se em vapores perfumados.

Os homens cultivam-se sem nódoa de terra.

O mundo está para lá do vidro.







O comboio passa, mas na gare, ninguém corre para o apanhar

nem ninguém luta por um lugar.



Música: Baby, it's cold outside, Ray Charles and Nina Simone

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Por falar em crianças,
deixo-vos com uma carta
de Omer Goldman,
que ainda recentemente,
era uma criança...







"O meu pai é Natalin Granot, um especialista em Irão que se demitiu de “número dois” da Mossad, em 2007, quando não o promoveram a chefe da principal agência de espionagem de Israel. Eu, Omer Goldman, 19 anos, sou uma pacifista e, hoje, regresso à prisão nº 400, numa base militar próxima de Telavive. Recuso-me a servir num exército que comete, todos os dias, crimes de guerra nos territórios palestinianos ocupados. Fui recrutada para o serviço militar obrigatório aos 18 anos, mas já no liceu eu decidira que não queria ir para a tropa.
Assim que deixei a escola, e antes de me inscrever na faculdade, dei aulas a crianças pobres num bairro de judeus etíopes. Quando me chamaram, entreguei uma declaração aos oficiais onde afirmava: “Recuso alistar-me nas Forças de Defesa de Israel (IDF). Não farei parte deste exército que, desnecessariamente, pratica actos de violência e viola os mais básicos direitos humanos.” No dia 23 de Setembro, sem ter sido julgada, fui cumprir 21 dias de detenção. Fui libertada a 10 de Outubro, mas voltei para um segundo período, desta vez apenas de 14 dias, porque fiquei doente. Saí novamente em liberdade, na sexta-feira, dia 30 de Outubro. Estes ciclos irão repetir-se até que o exército se canse, porque eu não vou desistir."


Omer Granot

Military ID 5398532

Military Prison nº 400

Military Postal Code 02447,

IDFIsrael


ou:


"Não chamem à minha atitude uma rebeldia de adolescente ou um acto de revolta por o meu pai ter saído de casa da minha mãe. É muito mais do que isso. Fui uma de 40 estudantes liceais que assinou a "Declaração 2008 dos Alunos do 12º ano" - altura em que somos recrutados pelo exército. Foi em Abril de 1970 que surgiu a primeira iniciativa, com carta enviada à primeira-ministra Golda Meir. Causou imenso furor. Já era um protesto contra a ocupação da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, conquistadas na guerra de 1967. Depois disso, houve mais três declarações, embora já não haja tanta polémica.Na prisão - uma prisão para raparigas dentro de uma prisão para rapazes -, tenho sorte porque estou com mais quatro alunas signatárias da "Declaração 2008", e duas delas são grandes amigas minhas, Tamar Katz e Mia Tamarin. É engraçado porque só enviam para aqui os "mais perigosos". Como podem classificar-nos como perigosas se somos pacifistas?Somos 60 raparigas no total, entre os 19 e os 20 anos, divididas em dois grupos de 30 para duas celas. Dormimos em colchões no chão e, todas as noites, uma de nós tem de ficar acordada para vigiar as outras... envergando um uniforme do exército norte-americano! É engraçado, não é?Acordamos às 5 da manhã e fazemos limpezas até à hora do pequeno-almoço. Retomamos as limpezas até à hora do almoço, e depois novamente até à hora do jantar. Na realidade, não há nada para limpar. Fingimos que limpamos - e nisto desperdiçamos imensa água, que Israel não tem - ou então pintamos umas pedras e tijolos.


Todos os que nos guardam são mulheres. Para mim, são elas as prisioneiras, e não nós. Questionam a nossa lealdade ao Estado e à religião. Gritam connosco a toda a hora e por razão nenhuma. Espezinham os nossos direitos, negando-nos o acesso a advogados. Só conseguimos, e nem sempre, alguns minutos por dia para falarmos com a família.Há um telefone fixo, quase sempre ocupado. Não há autorização para usar telemóvel. Podemos ler os livros que trazemos, mas as cartas que nos enviam do exterior são abertas previamente e nem sempre chegam até nós. Eles, os comandantes, não querem ceder porque sabem que, se o fizerem, estão a reconhecer que estão errados.Sonhos bonitos sem DeusNão somos sujeitas a tortura física, mas frequentemente conseguem quebrar-nos o espírito. Vamos dormir por volta das 22h00-23h00. Não somos nós que decidimos apagar a luz, nem quando podemos ir à casa de banho. São as guardas. Não é difícil adormecer porque quando caímos na cama estamos exaustas. Eu não tenho pesadelos. Só sonhos bonitos. Sonho que sou livre e estou a viajar pelo mundo. Quando me sinto mais triste, penso em coisas boas.Na prisão, nenhuma de nós acredita em Deus.Usamos a nossa cabeça e o nosso coração para encontrar forças. Falamos muito umas com as outras, e escrevemos cartas umas às outras durante a noite. Algumas raparigas, ainda que objectoras de consciência, nunca viram a realidade violenta e opressiva nos territórios ocupados que eu testemunhei. Começam agora a aperceber-se da necessidade de exigir mais respeito pelos direitos humanos.Não quero ficar na prisão muito tempo. Se me propuserem a possibilidade de serviço cívico aceitarei.", in Público



Fontes consultadas:
Jornal Público
http://frescaseboas.blogspot.com/2008/11/quem-omer-goldman.html
http://opedepupita.blogs.sapo.pt/118573.html
http://www.newprofile.org/showdata.asp?pid=1244
http://www.timesonline.co.uk/tol/news/world/middle_east/article4925056.ece
http://caledoniyya.com/2008/10/13/omer-goldman-the-unlikely-heroine/
http://wordpress.com/tag/omer-goldman/




O que nos diria ela hoje, caso pudesse falar?


Música: Blowin ' in the wind, Bob Dylan.

terça-feira, janeiro 06, 2009

- Aqui - da perversa rota do mundo...

Direitos da Criança



ARTIGO 1º Todas as pessoas com menos de 18 anos têm todos os seus direitos escritos nesta convenção.
ARTIGO 2º Tens todos esses direitos seja qual for a tua raça, sexo, língua ou religião. Não importa o país onde nasceste, se tens alguma deficiência, se és rico ou pobre.
ARTIGO 3º Quando um adulto tem qualquer laço familiar ou responsabilidade sobre uma criança, deverá fazer o que for melhor para ela.
ARTIGO 6º Toda a gente deve reconhecer que tens direito à vida.
ARTIGO 7º Tens direito a um nome e a ser registado, quer dizer, o teu nome, o dos teus pais e a data em que nasceste devem ser registados. Tens direito a uma nacionalidade e o direito de conheceres e seres educado pelos teus pais.
ARTIGO 8º Deves manter a tua identidade própria, ou seja, não te podem mudar o nome, a nacionalidade e as tuas relações com a família e menos que seja melhor para ti. Mesmo assim, deves poder manter as tuas próprias ideias.
ARTIGO 9º Não deves ser separado dos teus pais, excepto se for para teu próprio bem, como por exemplo, no caso dos teus pais te maltratarem ou não cuidarem de ti. Se decidirem separar-se, tens de ficar a viver com um deles, mas tens o direito de contactar facilmente com os dois.
ARTIGO 10º Se os teus pais viverem em países diferentes, tens direito a regressar e viver junto deles.
ARTIGO 11º Não deves ser raptado mas, se tal acontecer, o governo deve fazer tudo o que for possível para te libertar.
ARTIGO 12º Quando os adultos tomam qualquer decisão que possa afectar a tua vida, tens o direito a dar a tua opinião e os adultos devem ouvir seriamente o que tens a dizer.
ARTIGO 13º Tens direito a descobrir coisas e dizer o que pensas através da fala, da escrita, da expressão artística, etc., excepto se, quando o fizeres, estiveres a interferir com o direito dos outros.
ARTIGO 14º Tens direito à liberdade de pensamento e a praticar a religião que quiseres. Os teus pais devem ajudar-te a compreender o que está certo e o que está errado.
ARTIGO 15º Tens direito a reunir-te com outras pessoas e a criar grupos e associações, desde que não violes os direitos dos outros.
ARTIGO 16º Tens direito à privacidade. Podes ter coisas como, por exemplo, um diário que mais ninguém tem licença para o ler.
ARTIGO 17º Tens direito a ser informado sobre o que se passa no mundo através da rádio, dos jornais, da televisão, dos livros, etc. Os adultos devem ter a preocupação de que compreendes a informação que recebes.
ARTIGO 18º Os teus pais devem educar-te, procurando fazer o que é melhor para ti.
ARTIGO 19º Ninguém deve exercer sobre ti qualquer espécie de maus tratos. Os adultos devem proteger-te contra abusos, violência e negligência. Mesmo os teus pais não têm o direito de te maltratar.
ARTIGO 20º Se não tiveres pais, ou se não for seguro que vivas com eles, tens direito a protecção e ajuda especiais.
ARTIGO 21º Caso tenhas de ser adoptado, os adultos devem procurar ter o máximo de garantias de que tudo é feito da melhor maneira para ti.
ARTIGO 22º Se fores refugiado (se tiveres de abandonar os teus pais por razões de segurança), tens direito a protecção e ajuda especiais.
ARTIGO 23º No caso de seres deficiente, tens direito a cuidados e educação especiais, que te ajudem a crescer do mesmo modo que as outras crianças.
ARTIGO 24º Tens direito à saúde. Quer dizer que, se estiveres doente, deves ter acesso a cuidados médicos e medicamentos. Os adultos devem fazer tudo para evitar que as crianças adoeçam, dando-lhes uma alimentação conveniente e cuidando bem delas.
ARTIGO 27º Tens direito a um nível de vida digno. Quer dizer que os teus pais devem procurar que não te falte comida, roupa, casa, etc. Se os pais não tiverem meios suficientes para estas despesas, o governo deve ajudar.
ARTIGO 28º Tens direito à educação. O ensino básico deve ser gratuito e não deves deixar de ir à escola. Também deves ter possibilidade de frequentar o ensino secundário.
ARTIGO 29º A educação tem como objectivo desenvolver a tua personalidade, talentos e aptidões mentais e físicas. A educação deve, também, preparar-te para seres um cidadão informado, autónomo, responsável, tolerante e respeitador dos direitos dos outros.
ARTIGO 30º Se pertenceres a uma minoria, tens o direito de viver de acordo com a tua cultura, praticar a tua religião e falar a tua própria língua.
ARTIGO 31º Tens direito a brincar.
ARTIGO 32º Tens direito a protecção contra a exploração económica, ou seja, não deves trabalhar em condições ou locais que ponham em risco a tua saúde ou a tua educação. A lei portuguesa diz que nenhuma criança com menos de 16 anos deve estar empregada.
ARTIGO 33º Tens direito a ser protegido contra o consumo e tráfico de droga.
ARTIGO 34º Tens o direito a ser protegido contra abusos sexuais. Quer dizer que ninguém pode fazer nada contra o teu corpo como, por exemplo, tocar em ti, fotografar-te contra a tua vontade ou obrigar-te a dizer ou a fazer coisas que não queres.
ARTIGO 35º Ninguém te pode raptar ou vender.
ARTIGO 37º Não deverás ser preso, excepto como medida de último recurso e, nesse caso, tens direito a cuidados próprios para a tua idade e visitas regulares da tua família.
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ARTIGO 38ºTens direito a protecção em situação de guerra.
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ARTIGO 39º Uma criança vítima de maus tratos ou negligência, numa guerra ou em qualquer outra circunstância, tem direito a protecção e cuidados especiais.
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ARTIGO 40º Se fores acusado de ter cometido algum crime, tens direito a defender-te. No tribunal, a polícia, os advogados e os juizes devem tratar-te com respeito e procurar que compreendas o que se está a passar contigo.
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ARTIGO 42º Todos os adultos e crianças devem conhecer esta Convenção. Tens direito a compreender os teus direitos e os adultos também.
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Música: Rokia Traore e Toumani Diabaté

segunda-feira, janeiro 05, 2009




Domado o mar, cerro o olhar neste nevoeiro, nesta ignorância, nesta cegueira.

Esperança farpada na pele.

Corpo curvo de arames, sob o peso do mundo.

Sublimado fogo no tempo?

Restam-nos os impotentes lamentos no silêncio dos homens.

Desdobra-te água do mar em mil rios de penas minhas...

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Música: Tortoise (Water), Shanghai Traditional Chinese Orchestra

quinta-feira, janeiro 01, 2009





No pano gasto de um avental,

contam-se,

o número das quebradas folhas estendidas,
o número das receitas aprendidas,
o número dos temperos inventados,

o número dos fogos ateados.


Improvisados.


O número de mãos que o vestiram.
O número de olhos que o despiram.




O número dos sonhos amassados.
(levedados, qb.)
O número das esperas em vão,
em pitadas e em grão.
O número das ceias festejadas.
E o das velas apagadas.


O número dos carnais festins,
vaporizado Bacco, em adormecidos carmins.


Avarento nos números, em si guarda, os momentos de vida, com que se salpicou, humanizou, cristalizou.


Será nos condimentos que reside a magia do fogo lento que o alimenta, sem consumir?...



Ah!...Sábio avental de pano cru!...









Música: No woman No cry, Joan Baez e agora, Bob Marley