quinta-feira, junho 25, 2009







Sabes querida, eu acredito que as mãos trazem em si mensagens que nem sempre os olhos conseguem desvendar na leitura.
Eu intuio que é na pele, destas que se dão e em si recebem, que reside um qualquer código genético, que poderá salvar o mundo.
Ou apenas salvar-me a mim e a ti, da distância geográfica que nos separa.
E será através da pele que as nossas mãos se reconhecerão.

É por isso.

É por isso que as mãos sempre foram tão importantes para mim.

Um destes dias, quando os teus olhos procurarem no recorte das estrelas desenhadas por mim, a magia da noite, conto-te uma história de mãos, de mãos dadas, contigo.






"...era uma vez umas mãos que há tanto tempo
não mediam o seu tamanho por outras,
que já nem sabiam o tamanho,
que as mãos, poderiam ter. "


segunda-feira, junho 22, 2009

E porque me falam em ecologia
e porque gosto do silêncio dos lugares esquecidos
e porque já tenho saudades do Gerês e de outros oásis, entretanto encontrados...



















preservemos.

Aqui e além das nossas vulgares rotas.




E porque falar do Gerês é falar de Miguel Torga, viajemos também nas suas palavras,


Aparelhei o barco da ilusão
e reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho,
e traiçoeiro
O mar...
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).

Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.




quarta-feira, junho 17, 2009

Algo me diz que estou a precisar de férias...



sábado, junho 13, 2009









Muitas vezes tenho reflectido sobre a sorte de não viver num condominio fechado.
E até de não conduzir. É sem dúvida também nas ruas e transportes públicos desta minha cidade, que tomo a medida real do povo que somos. Nem sempre o contacto é de esperança. Nem sempre o conhecimento do outro, nos traz alguma empatia ou conforto. Nem sempre acontece gostarmos do que vemos. Mas a realidade, transpõe coerente e racionalmente o que nos identifica nos outros. É também no choque, no assombro, que tomamos a medida do real que somos.


Individual e colectivamente vamos abordando a realidade alheia: dois passos à frente, um atrás.Encontros de segundos, outros mais alongados no tempo e no espaço, todos são plataforma de possível conhecimento e crescimentom ainda que a percepção sem concepção seja cega. Porque será que uma pessoa má, sem valores, amarga, invejosa, mentirosa, lê diárimente, a caminho do emprego, Paulo Coelho? Que procurará nele?Que lhe dará ele?

Que será que aconteceu à mulher que entra no café e abruptamente à laia de troco, sacode para o balcão um "só encontro merda no meu caminho"? Que vida terá a outra que da sua janela no Bairro Alto desabafa com a vizinha, "oh filha vou mudar a fralda ao velho, que eu tenho uma sina fodida "? Sei que são também estas, as pessoas reais da minha cidade, para lá do jazz à quinta no ccb, para lá da Catarina com o doce sabor a maçã de António Alçada Baptista e outras Severas, de quem reza a história. E assim, atenta aos sinais e aos outros que comigo se cruzam, gosto de trazer para casa um sinal que seja de mudança. Nem sempre acontece, mas aconteceu ontem.


Estavam 37º e o sol a pique. Sentada numa paragem de autocarro, vi chegar o grupo de homens,
oriundo da mesquita, onde tinham terminado os serviços religiosos. Atrás deles, caminha um homem sózinho, carregando um saco que se adivinha pesado. Agora todos nós fazemos parte do mesmo grupo (indiferente a raças, credos, culturas): estamos a um passo da Gulbenkian, numa paragem, aguardando o mesmo autocarro, sob um sol rigoroso e inclemente.


A surpresa começa a acontecer, quando o último homem, o do saco pesado, vem ao nosso encontro. Abrindo-o, apenas com um sorriso, oferece o (ainda) misterioso conteúdo. Do primeiro ao último homem percorridos, todos retiram do seu interior uma pequena garrafa de água. Incrédula, percebo que agora se dirige a mim. Também eu sou abençoada com uma garrafa de água, que agradeço retribuindo o sorriso.


São estes retalhos de vida real que me fazem acreditar na mudança.
São estes pequenos recipientes de água e de esperança, que me fazem validar o pensamento:
a mudança somos nós.


A mudança está em nós, se metafóricamente não vivermos num condomínio fechado e se, sem qualquer metáfora, conseguirmos sair à rua, crentes de que não somos donos de nenhuma verdade absoluta. É afinal tudo tão relativo, neste mundo em constante mutação...







Música: Ray Lema, e Búzios de Ana Moura.

quinta-feira, junho 11, 2009





Na aresta escondida do pronome
existe um instinto possessivo alarmantemente ganancioso
de necessidade territorial.

O pronome guarda no seu avesso,
uma âncora de ferro,
vulgar e ácidamente temporal,
à mercê das correntes subterrâneas do "eu".

Na tarde, sem espelho que me devolva sorriso, careta ou resposta,
ainda me debato na associação de ideias:
-quando será o pronome tão sómente, pronúncio de afecto?
-quando será que alguém o deve teimar, sem aceitar a censura?


[ não importa que não seja meu,

de alguma forma -ainda que estranha a convenções,
liberdades individuais, destinos, sinas, corpos ou posses, é "meu" ]




Música: Princess of the sand (Strange meeting II), Nick Drake


domingo, junho 07, 2009

O puto cresceu, Dulce.
Repara na mudança: é ele que hoje nos leva para a boémia da noite.
A cerveja gelada. A caipirinha atordoante.O puto cresceu, Dulce.
Repara na precisão dos seus dedos nas cordas sensíveis.
No seu semblante sereno e atento.
No sorriso feliz, mas timido, quando os outros que o acompanham,
lhe fazem saltar o seu segundo solo.
Olho-te Dulce, tens um olhar cheio de brilho e de amor,
de quem conseguiu fintar o labirinto, descobrir a saída e, com mais ou menos sacos, fazer frente à noite.
Faço-te uma careta, o açúcar de tia emprestada,
amiga herdada às primeiras horas de nascença como um apêndice,
sobe-me à cabeça, o puto cresceu, Dulce.
Lembro-me dele com cinco dias. Tinhas um cão e eu tinha medo de cães. imagina.
O cão lambia-me as mãos e eu lavei-as para pegar no puto.
Há sete anos vi-lhe esta mesma expressão enquanto víamos o "Fabuloso destino de Amélie Poulain", sentados nas cadeiras do Fonte Nova, lembras-te? Era dia de ano novo.
Mal tinhamos dormido, estavamos bebedas de sono.
E ele atento, olhos no ecran, maravilhado com os olhos da Amélie.
Mergulhado no enredo que se estendia mágico, mas complexo, para um puto de nove anos.Também foi este ar que lhe vi quando aos 11 anos, me descreveu a Praça Jamal El Fna.
O puto cresceu.
Um destes dias vai encontrar a sua primeira Amélie, e vai-se perder numa qualquer cidade desconhecida, agora que sabe como a música se constroi, meia dose de intuição e sensibilidade, outra meia de prática, e mais uma, bem medida e inteira, de estudo e atenção.
O puto cresceu, Dulce. Olho o Eduardo, pai nas nuvens, as tias verdadeiras, as restantes emprestadas, os tios emprestados, todos nós embevecidos.
O puto cresceu, Dulce.
E nós também.









Música: Wonderwall, The Coltrane Quartet.

quinta-feira, junho 04, 2009





inverter o caldo entornado.



conseguiremos? :)






Música: Purple Rain.