sexta-feira, janeiro 09, 2009

Por falar em crianças,
deixo-vos com uma carta
de Omer Goldman,
que ainda recentemente,
era uma criança...







"O meu pai é Natalin Granot, um especialista em Irão que se demitiu de “número dois” da Mossad, em 2007, quando não o promoveram a chefe da principal agência de espionagem de Israel. Eu, Omer Goldman, 19 anos, sou uma pacifista e, hoje, regresso à prisão nº 400, numa base militar próxima de Telavive. Recuso-me a servir num exército que comete, todos os dias, crimes de guerra nos territórios palestinianos ocupados. Fui recrutada para o serviço militar obrigatório aos 18 anos, mas já no liceu eu decidira que não queria ir para a tropa.
Assim que deixei a escola, e antes de me inscrever na faculdade, dei aulas a crianças pobres num bairro de judeus etíopes. Quando me chamaram, entreguei uma declaração aos oficiais onde afirmava: “Recuso alistar-me nas Forças de Defesa de Israel (IDF). Não farei parte deste exército que, desnecessariamente, pratica actos de violência e viola os mais básicos direitos humanos.” No dia 23 de Setembro, sem ter sido julgada, fui cumprir 21 dias de detenção. Fui libertada a 10 de Outubro, mas voltei para um segundo período, desta vez apenas de 14 dias, porque fiquei doente. Saí novamente em liberdade, na sexta-feira, dia 30 de Outubro. Estes ciclos irão repetir-se até que o exército se canse, porque eu não vou desistir."


Omer Granot

Military ID 5398532

Military Prison nº 400

Military Postal Code 02447,

IDFIsrael


ou:


"Não chamem à minha atitude uma rebeldia de adolescente ou um acto de revolta por o meu pai ter saído de casa da minha mãe. É muito mais do que isso. Fui uma de 40 estudantes liceais que assinou a "Declaração 2008 dos Alunos do 12º ano" - altura em que somos recrutados pelo exército. Foi em Abril de 1970 que surgiu a primeira iniciativa, com carta enviada à primeira-ministra Golda Meir. Causou imenso furor. Já era um protesto contra a ocupação da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, conquistadas na guerra de 1967. Depois disso, houve mais três declarações, embora já não haja tanta polémica.Na prisão - uma prisão para raparigas dentro de uma prisão para rapazes -, tenho sorte porque estou com mais quatro alunas signatárias da "Declaração 2008", e duas delas são grandes amigas minhas, Tamar Katz e Mia Tamarin. É engraçado porque só enviam para aqui os "mais perigosos". Como podem classificar-nos como perigosas se somos pacifistas?Somos 60 raparigas no total, entre os 19 e os 20 anos, divididas em dois grupos de 30 para duas celas. Dormimos em colchões no chão e, todas as noites, uma de nós tem de ficar acordada para vigiar as outras... envergando um uniforme do exército norte-americano! É engraçado, não é?Acordamos às 5 da manhã e fazemos limpezas até à hora do pequeno-almoço. Retomamos as limpezas até à hora do almoço, e depois novamente até à hora do jantar. Na realidade, não há nada para limpar. Fingimos que limpamos - e nisto desperdiçamos imensa água, que Israel não tem - ou então pintamos umas pedras e tijolos.


Todos os que nos guardam são mulheres. Para mim, são elas as prisioneiras, e não nós. Questionam a nossa lealdade ao Estado e à religião. Gritam connosco a toda a hora e por razão nenhuma. Espezinham os nossos direitos, negando-nos o acesso a advogados. Só conseguimos, e nem sempre, alguns minutos por dia para falarmos com a família.Há um telefone fixo, quase sempre ocupado. Não há autorização para usar telemóvel. Podemos ler os livros que trazemos, mas as cartas que nos enviam do exterior são abertas previamente e nem sempre chegam até nós. Eles, os comandantes, não querem ceder porque sabem que, se o fizerem, estão a reconhecer que estão errados.Sonhos bonitos sem DeusNão somos sujeitas a tortura física, mas frequentemente conseguem quebrar-nos o espírito. Vamos dormir por volta das 22h00-23h00. Não somos nós que decidimos apagar a luz, nem quando podemos ir à casa de banho. São as guardas. Não é difícil adormecer porque quando caímos na cama estamos exaustas. Eu não tenho pesadelos. Só sonhos bonitos. Sonho que sou livre e estou a viajar pelo mundo. Quando me sinto mais triste, penso em coisas boas.Na prisão, nenhuma de nós acredita em Deus.Usamos a nossa cabeça e o nosso coração para encontrar forças. Falamos muito umas com as outras, e escrevemos cartas umas às outras durante a noite. Algumas raparigas, ainda que objectoras de consciência, nunca viram a realidade violenta e opressiva nos territórios ocupados que eu testemunhei. Começam agora a aperceber-se da necessidade de exigir mais respeito pelos direitos humanos.Não quero ficar na prisão muito tempo. Se me propuserem a possibilidade de serviço cívico aceitarei.", in Público



Fontes consultadas:
Jornal Público
http://frescaseboas.blogspot.com/2008/11/quem-omer-goldman.html
http://opedepupita.blogs.sapo.pt/118573.html
http://www.newprofile.org/showdata.asp?pid=1244
http://www.timesonline.co.uk/tol/news/world/middle_east/article4925056.ece
http://caledoniyya.com/2008/10/13/omer-goldman-the-unlikely-heroine/
http://wordpress.com/tag/omer-goldman/




O que nos diria ela hoje, caso pudesse falar?


Música: Blowin ' in the wind, Bob Dylan.

29 comentários:

Eme disse...

embora não defenda nem Israelitas nem Palestinianos, admira-me a postura que mantém sendo tão jovem e mantendo as suas convicções. é de louvar. não saberia o que lhe dizer. saberia talvez gritar aos povos que a olhassem e a seguissem no caminho da paz.

gostei imenso.

beijo

Alberto Oliveira disse...

... costumamos, erradamente, generalizar criticando, os povos dos paises que participam em conflitos armados contra a independência de outros paises ou que cujas formas de governo, se nos afiguram pouco ortodoxas ou menos democráticas.
Esquecemos que, no caso vertente, muitas vozes israelitas se levantam contra os seus líderes como é o caso desta jovem.


beijinhos.

Justine disse...

Tenhamos esperança que o exemplo desta jovem se multiplique por centenas, milhares de outros jovens

adouro-te disse...

Estou com M.(acima)!
Que dizer aos jovens israelitas e palestinianos nestas condições?
Obrigado por me fazeres pensar.
Beijo.

Filipe disse...

gostei da parte dos sonhos bonitos em que ele, ou ela? se via a viajar pelo mundo...

uf! disse...

Tomei a liberdade de deixar um link para aqui; espero que não se oponha.
antecipadamente grata,

Marcia Barbieri disse...

Eu sou da paz,embora entenda tão pouco sobre isso,sempre guerras dentro de mim,batalhas, nas quais muitas vezes o inimigo se faz vencedor.Parabéns pelo texto tão humano!!!

beijos ternos

bsh disse...

De facto, é dificil de responder.

http://desabafos-solitarios.blogspot.com/

Alien8 disse...

Arabica,

Assim se revela a verdade. A verdade que muitos desconhecem, infelizmente.

A verdade que separa povos de governantes belicistas e interesses materiais.

Não preciso de dizer mais. Certamente já leste o que penso noutro local.

Só quero dar-te os parabéns.

E um beijo.

Bom fim de semana.

mdsol disse...

Obrigada pelo post! Não conhecia este "caso"
:))

Licínia Quitério disse...

Em tempo de guerra, as mulheres carrascos, as mulheres vítimas. Haverá muitos casos deste, acredito. Se alguém ficar para contar, em que se tornarão os filhos deste povo?
Obrigada por teres trazido aqui esta notícia.

Um beijo. Um abraço.

Rosa dos Ventos disse...

Hoje ela diria o mesmo e com razões ainda mais fortes.
Quando todos os jovens disserem não aos senhores da guerra talvez as fábricas de armamento fechem as portas e os seus trabalhadores sejam encaminhados para tarefas bem mais produtivas do ponto de vista humanitário!

Abraço

Luís Serpa disse...

Todas as opiniões que se defendem, se sustentam e pelas quais se está pronto a lutar são bonitas.

Seria contudo interessante saber como seria tratado pelo Hammas um caso semalhante. Será que a menina poderia falar, e lutar pelas suas convicções? Será que a menina teria - comecemos por aqui - o direito de ter opiniões?

Duvido.

Arábica disse...

Caro Luís,

Interessante e pertinente a sua dúvida. Sobre o futuro (para não referir o presente) das crianças nascidas e vivas na Faixa de Gaza, muitos olhares pousam, muitas preocupações nascem, muitos debates tomam lugar.

Serão algum dia capazes de esquecer ou gerir de forma construtiva, o medo, a fome, o desamparo, o infortúnio, o desespero, o ódio que nasce da impunidade e do sentimento de injustiça, o ruído das bombas, o grito dilacerante do meio envolvente?

Será que chegarão vivos aos 18 anos?

Será que poderão ter o direito a saúde, educação, paz, ambiente sólido e afectuoso, equilibrio e actividades próprias das crianças, um dia?

Será que algum dia, serão crianças?

Meu caro Luís, também duvido.

Manuel Veiga disse...

... "mesmo aí é possível a surpresa/ uma boina uma estrela um vírus/ou talvez um coração/A fala o sopro uma batida/Che..."

M. Alegre - in poema CHE.

beijo

pb disse...

passei para te deixar um beijo de bom fim de semana

ze disse...

"O que nos diria ela hoje, caso pudesse falar?"

Interessa-me mais saber o que lhe diria eu, se lhe escrevesse hoje.
Sentiria-me melhor, mais útil, mais justo.
Penso que ela merece que lhe escreva-mos, mostrando-lhe que o mundo é composto de pessoas e não de números, que uma carta vale mais que um abaixo assinado, porque resulta de uma vontade individual consciente e não de uma manipulação de multidões anónimas, telespectadoras, leitoras, manifestantes de rua, exércitos regulares ou irregulares- números.
Eu também não me quero refém de números, raça, naturalidade, religião, grupo.
E apesar de isso ser o que menos interessa ao(s) poder(es), ou precisamente por isso, é o que é preciso fomentar- A individualidade, a opinião formada em nós e não comprada feita por perfeita que pareça.
Ainda que corramos o risco de ficar sozinhos.

bettips disse...

Aqui te deixo o meu abraço, sem selo que não sei... (nunca ponho, mas fico feliz por lembrares).
Aqui te deixo a vontade que sejamos muitos e MUITAS a romper o papel e a mesa, a burocracia dos encontros e discussões mornas. Aqui deixo, também contigo e em ti, a minha esperança.
Bjinho

Filipe disse...

Aquela jovem mulher da fotografia, é a Omer?

Arábica disse...

Bom dia, Pipa, sim aquela jovem mulher da fotografia é a Omer.
Nos links indicados e que foram fonte de consulta, poderás encontrar outras fotos e mais informação.

Filipe disse...

Concordo com o Zé. Temos de escrever a toda a gente envolvida a começar pelo presidente que manda no mundo. Dia 20 a primeira carta que o presidente havaiano receber tem de ser portuguesa e sobre a omer!

Filipe disse...

ouvi dizer que 90% dos israelitas estão com o movimento do governo...

Filipe disse...

Arábica, Estou muito triste com isto tudo.
Achas que a Omer Goldman está disposta a devolver Israel à Palestina?

Arábica disse...

Pipa,

não sou analista politica, nem visionária...


O que te posso dizer é que acredito nos direitos das minorias.
E no respeito, pelas escolhas individuais de cada um.


Bom fim de semana!

Filipe disse...

Arábica,

Está em causa a liberdade de seres humanos que se opõem à conduta do seu próprio governo.
Para ousar meter o bedelho em assuntos alheios temos de ser bons. Nós não fugimos a questões construtivas.
Achas que a Omer Goldman está disposta a entregar Israel à Palestina?
É legitimo os interesses individuais sobreporem-se aos interesses da Nação?

Arábica disse...

Pipa,

Na minha visão pacifista, não concebo um país, um estado de direito, onde as mulheres e os homens são obrigados a servir esse mesmo país, através da guerra.

Julgo que há outras formas de se servir um país.

São uma minoria decerto, mas deveriam ser ouvidas e respeitadas.


Sem se sobreporem, podem coexistir.

Filipe disse...

Arábica,

podem coexistir sem pôr em causa a autoridade governamental?

Arábica disse...

Pipa, Pipa...


Depende da autoridade governamental.

Se essa autoridade tiver medo de perder a autoridade através do respeito pela liberdade individual das suas cidadãs e cidadãos, no que concerne aos seus deveres e direitos...

E depois, sabes, este campo de batalha é demasiado minado, entram aqui, valores religiosos, História, Memórias...

Não estamos a falar de um simples País ou de uma simples autoridade governamental, como tu bem sabes...

Abraço

Filipe disse...

Arábica,

Se a autoridade tiver medo de perder a autoridade????Estás cansada. Acabei de saber que erimitaste. Descansa! Peguei no testemunho e vou correr até me cansar a sério. Nessa altura talvez já possas estar em condições de ir para o médio oriente outra vez.
Um abraço grande!